Capítulo do livro “A Conquista dos Coronéis”, do professor Durval Menezes*

A Rua Grande com a Catedral a Nossa Senhora das Vitórias ao fundo

Muito  tempo  antes  daquela  resposta  negativa  e  grosseira  do governador Góis Calmon, em 1925, ao coronel Zeferino Correia de Melo, quando este, acompanhado de outros coronéis, foi ao Palácio do Governo reivindicar  recursos  para  a  construção  de  uma  estrada  –  “… Conquista precisa é de estradas para boiadas e estas  já existem…” –, em 1803 o coronel João Gonçalves da Costa já expressava sua preocupação com os obstáculos criados principalmente pela Igreja Católica e pelo poder judiciário. Assim relatou  o  coronel:  “…estão  os  Sertões  todos  acabados  e  quem  os  tem acabados  são  os  juízes  de  órfãos  e  os  Padres  (vigários),  pois,  estes  se apegam a um costume antigo de levarem duas patacas (moeda de prata), a cada pessoa, filhos, família e escravos, a pataca pela desobriga e por cada criança que batizam, quatros patacas, e outro  tanto de oferta, de casar quatro mil  réis  de  estola, e  dez  patacas  dos  banhos,  quatro mil  réis  de  fazer perguntas aos noivos se fizeram votos de castidade, e à vista disse que é melhor  ser  índio no mato de que  ser cristão em semelhante TERRA…”

Conquista pertencia à jurisdição da Comarca de Jacobina situada a mais  de  cem  léguas.  Em  casos  de  inventário,  o  juiz  e  o  escrivão  se deslocavam até a localidade onde tramitava o processo, e, muitas vezes, o valor cobrado era  superior aos bens deixados pelo falecido.

O príncipe Maximiliano também criticou a Igreja ao se deparar com um padre embriagado: “… pareceu-me grande apreciador de bebidas fortes, pelo menos a  julgar pelo  seu estado de completa embriaguez…”.

INTOLERÂNCIA RELIGIOSA – Era uma prática comum em várias cidades  dos  sertões  a  expulsão  de  padres  quando  considerados impertinentes,  com  conduta  desabonadora  ou  quando  interviessem  nos interesses dos coronéis. Muitas vezes para constrangê-los e humilhá-los, as pessoas pintavam com  fezes as paredes e  janelas de  suas casas.

Quanto a esse procedimento, nunca aconteceu em Conquista com os dirigentes e membros da Igreja Católica. Sempre existiu um respeito e uma ótima convivência entre as seitas religiosas, os coronéis e a comunidade. A não ser o episódio de pichação e ameaças por ocasião da inauguração do primeiro  Templo  Batista  nesta  cidade,  quando  um  grupo  de  senhoras intolerantes e  ignorantes picharam e  fizeram ameaças aos evangélicos. Mas, foram energicamente repreendidas pelos coronéis e até mesmo ameaçadas de expulsão da  Igreja Católica pelo padre da cidade.

QUESTÃO AGRÁRIA – Hoje se dá muita ênfase à questão da terra porque  diz  respeito  aos  “sem-terra”.  Este  problema  social  agrário  em Vitória da Conquista é secular. Lá pelos  idos de 1800,  já existiam nesta região vários processos de reintegração de posse, movidos por proprietários contra pessoas que ocuparam  suas  terras.

As práticas utilizadas pelos invasores de terras eram praticamente as mesmas  de  hoje:  invasão  da  fazenda,  derrubada  de  cerca, matança  de algumas cabeças de gado,  levantamento de casebres e pequenas plantações. Existem vários documentos em cartório que  registram essas ocorrências.

CORONÉIS  HONESTOS  –  Muitos  coronéis  foram  acusados  de enriquecimento através da rapinagem. Os coronéis de Conquista, pelo seu passado  de  lutas,  parece  não  terem  adquirido  o  gene  da  rapinagem. Provavelmente  devem  ter  cometido  muitos  deslizes,  mas  não  se  tem conhecimento de que  foram  ladrões. Talvez por  ter  sido quase  todos da mesma parentela. O mesmo não se pode dizer dos coronéis dos grandes sertões  do Nordeste,  que  utilizavam  os  serviços  dos  cangaceiros  para  a prática  criminosa  da  rapinagem,  assaltando,  matando  e  saqueando comunidades  inteiras. É  o  caso  do  famoso  coronel Pereira Lima,  chefe político nordestino,  segundo Lampião, que, mandou  saquear a cidade de Souza na Paraíba em 1924. O próprio Lampião denunciou esse coronel com as seguintes palavras:  “…  foi o coronel Pereira Lima, homem perverso,  falso e ladrão, a quem durante muitos anos servi prestando os meus vantajosos serviços da nossa profissão…”. Esta declaração de Lampião foi publicada no  jornal “O Ceará” em 1926.

*O Conversa de Balcão irá publicar alguns textos do livro, com a permissão do seu autor, durante esta semana do aniversário de 172 anos de Vitória da Conquista.

Comentários

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