O palco está totalmente escuro quando surge a face branca da cantora, sob um foco de luz, iniciando a música “Da maior importância”, gravada em 1973 no disco “Índia”. A letra, de Caetano, diz: “deve haver uma transa qualquer pra você e pra mim” – e, realmente, há alguma coisa inexplicável entre Caetano Veloso e Gal Costa, reafirmada pelo disco “Recanto”. E foi assim que Gal iniciou o show que virou o dvd do seu mais recente trabalho.
O disco lançado em 2011 foi o trigésimo da carreira de Gal Costa. Nele, Gal supreendeu. Primeiro por ser composto por 11 faixas, todas de Caetano Veloso, e por ter sido produzido pelo próprio, o mesmo que dividiu com ela o seu primeiro disco, “Domingo”, em 1967. Além disso, com “Recanto”, Gal voltava aos estúdios, depois de seis anos, com uma batida diferente, misturando rock, música eletrônica, dub-step, texturas alternativas e experimentais. Uma Gal moderna, sobretudo quando ela arrisca passinhos em “Neguinho”.
“Existe aí uma conexão forte, espiritual e musicalmente”, revela Gal sobre o elo entre ela e Caetano, principalmente, à paixão de ambos por João Gilberto. “João nos uniu”, resume. E confessa: “Ouço as canções de Caetano como se fossem minhas”.
Lançado neste mês, “Recanto Ao Vivo” foi gravado em outubro do ano passado no Rio de Janeiro, no Theatro Net Rio, mesmo espaço em que ela registrou “Fa-Tal”, em 1971 (antigo Teatro Tereza Rachel). O show também foi dirigido por Caetano e incluiu músicas da sua fase mais tropicalista, na década de 70, como “Vapor barato”, “Divino Maravilhoso”, “Baby” e “Força Estranha”. Reviver a época fez Gal chorar durante o show, justamente em um dos solos de guitarra, marca característica do “Fa-Tal”.
Incluir esses clássicos de Gal no show serviu para quebrar o clima. O show é tocado em tons sombrios, dramático, como são as músicas novas, em sua maioria, todavia, as regravações aparecem sob novas roupagens. “Folhetim”, por exemplo, é originalmente um bolero, mas está mais para blues no novo registro. Na turnê de “Recanto”, Gal é acompanhada pelos jovens Bruno de Lulli (baixo), Pedro Baby (guitarra) e Domenico Lancellotti (bateria, MPC 1000 e vocal).
Ao todo são 23 faixas, entre elas “Um dia de domingo”, sucesso na voz de Tim Maia, que ela gravou em 1985 em dueto com ele. No show, Gal trouxe Tim de volta numa descontraída imitação do cantor. Das recém-criadas, estão as canções “Tudo dói”, “Recanto escuro”, “Autotune autoerótico”, “Neguinho”, “Cara do mundo”, “Segunda”, “Mansidão” e o funk “Miami maculelê”.
Sobre a influência de Caetano no trabalho, ela disse: “O disco tem a cara dele, porque assina a concepção e todas as canções. Mas o show tem minha própria identidade, minha voz”, avalia e comemora: “esse disco angariou um novo público. A juventude já estava ouvindo meus discos antigos, mas esse trabalho veio a calhar”.
Em abril, a baiana retomará a turnê nacional de “Recanto”. Vai voltar às capitais, a começar por São Paulo e Salvador. Em apresentação durante o Natal da Cidade, no ano passado, em Vitória da Conquista, ela anunciou que também traria o show para a cidade, em julho ou agosto. Vamos aguardar!
DVD RECANTO AO VIVO
GAL COSTA
2013; Universal; 23 Faixas
Preço médio: R$ 40