Um abraço maior que os outros, mais amplo, quem sabe até universal. É um Abraçaço, palavra que o cantor Caetano Veloso usa para terminar seus e-mails e que dá nome ao seu novo disco, que chega neste mês de dezembro às lojas de todo o País.
O trabalho não deixa dúvidas de que, no alto de seus 70 anos, Caetano sabe que é preciso delicadeza para falar de certas coisas. Por isso levou seu violão ao estúdio de gravação e com ele fez as canções soarem bem poéticas – estivesse ele cantando versos de amor ou contando a trajetória do guerrilheiro Carlos Marighella.
Abraçaço fecha a trilogia de trabalhos de Caetano com a banda Cê, depois dos discos Cê (2006) e Zii e Zie (2009). É exatamente o violão que dá a diferença de tom em relação aos dois anteriores: mais autobiográfico e sensível, Abraçaço promete conquistar rápido os ouvidos dos fãs daquele Caetano que cantava com seu violão no início da década de 1970.
Não que seja o mesmo Caetano, não que sejam as mesmas canções. Produzido por Moreno Veloso, filho de Caetano, e Pedro Sá, um dos integrantes da banda Cê, o disco novo revela um artista múltiplo, capaz de transformar um e-mail de aniversário em música.
Faixas – Ousado, Caetano criou a canção Parabéns a partir de uma mensagem enviada a ele pelo cineasta Mauro Lima, na ocasião de seu aniversário. O e-mail foi na íntegra para o encarte do CD e virou a letra da canção.
Na verdade, é simples entender Abraçaço: lembra o Caetano de violão na mão da década de 1970, mas, na verdade, é outro, o contemporâneo.
O mesmo tom atual aparece em A Bossa Nova é Foda: nesta que é forte candidata a melhor música do disco, são evocados heróis/lutadores contemporâneos, como Minotauro, Júnior Cigano e Vitor Belfort. A reinvenção do
País acontece graças às mãos do bruxo de Juazeiro, o cantor João Gilberto. A conclusão é simples e absoluta: a bossa nova é foda.
No disco novo tem também funk carioca (na faixa Funk Melódico) e uma canção em homenagem ao guerrilheiro baiano Carlos Marighella, intitulada Um Comunista, em que Caetano mistura sua história à dele.
Inspirado pelo filme Eu Receberia as Piores Notícias de Seus Lindos Lábios, de Beto Brant e Renato Chiasca, e pelo livro de mesmo nome de Marçal Aquino, Caetano compôs O Império da Lei.
Participações – Uma das surpresas do disco fica por conta da última faixa, a sensível Gayana, de autoria de Rogério Duarte. Foi ele quem fez o famoso cartaz do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964), de Glauber Rocha, além de capas dos primeiros discos tropicalistas de Gil e do próprio Caetano. Em Gayana, Moreno Veloso toca baixo e pratos.
Na faixa Parabéns, as vozes de Thalma de Freitas, Nina Becker, Lan Lan e Alinne Moraes (ela mesma, a atriz) se juntam à de Caetano num parabéns pra lá de estiloso: “Tuda mega bom/ giga bom/ tera bom”.
Tom pessoal – A delicadeza impressa em Abraçaço pelo violão de Caetano se eleva à sua máxima potência em três canções: Vinco, Estou Triste e Deixa o Galo Cantar. Sensíveis e autobiográficas, as três têm como ponto alto a perfeita combinação entre letra e melodia, como em Estou Triste: “E o lugar mais frio do Rio/ É o meu quarto”. Ah, Caetano, um abraçaço para você.
(Por Mariana Paiva, do A Tarde)