Por Gil Britopedral gil brito

 

A não ser por uma rápida entrevista que fiz com ele em 2008, nunca conheci José Pedral pessoalmente. Conheci, sim, o mito que se criou em torno de sua figura pública. Aliás, os mitos. Há pelo menos três Pedrais, por assim dizer. Como qualquer personalidade humana é naturalmente complexa e multifacetada, se vasculharmos mais, certamente poderemos encontrar ainda vários outros. Mas aqui nos concentraremos nesses três.

O primeiro é o jovem e arrojado prefeito de Vitória da Conquista, com ideias progressistas, quase socialistas, ainda de rosto imberbe e mantendo boas relações com o então presidente João Goulart. Dedurado, foi conduzido à prisão e cassado pela arbitrariedade do golpe militar de 1964.

Esse Pedral, posso dizer que o conheci antes mesmo de vir morar na cidade. Ainda criança, ouvia meu avô contar toda a movimentação ocorrida em Vitória da Conquista, que ele acompanhara passo a passo pelo rádio, da longínqua Guajeru, naquele fatídico 1º de abril – inclusive a prisão do jovem prefeito conquistense.

– Como era o nome dele? – perguntava eu, curioso.

– Jota Pedral – respondia meu avô, mencionando o nome que as ondas do rádio lhe fixaram na memória.

O segundo Pedral, já com o indefectível bigode e amadurecido após mais de uma década sem direitos políticos, surgiu nos anos 80. Era o carismático líder político que tinha de volta, devolvido democraticamente pelo povo, o mandato que a ditadura lhe arrancara em 1964.

Esse Pedral, reforçado pelos ecos de sua versão anterior e baseado em obras de infraestrutura na cidade, consolidou sua liderança regional e as características míticas, que ainda seriam suficientes para conduzi-lo a uma terceira e bem menos gloriosa passagem pela Prefeitura da cidade, já nos anos 90. As feições do mito, a partir de então, se aglutinariam, de forma bem mais humanizada, no terceiro e último Pedral que conheci: o senhor já idoso, de cabelos alvos e bigodes da mesma cor – agora acrescidos de um frondoso cavanhaque. Oficialmente fora dos embates políticos, o velho líder mantinha agora uma discreta atuação nos bastidores.

Dos três Pedrais, esse último foi o único que eu e minha geração chegamos a ver de perto. A última chance que tivemos de fazer isso foi durante seu velório, na Casa Memorial Régis Pacheco, a mesma na qual, em outros tempos, vivera o ex-governador e ex-deputado que, nos anos 50 e 60, fora um de seus principais inspiradores políticos.

Na sala lotada, cujas paredes são adornadas por quadros com os rostos de todos os homens que já ocuparam a Prefeitura de Vitória da Conquista, o último Pedral enfim se despediu – velado de perto, também, pelos retratos dos Pedrais anteriores.

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