Artigo de Bruno Barros Barreira no Observatório da Imprensa.
O partidarismo presente nos principais meios jornalísticos do Brasil é evidente. O fato tem gerado incontáveis críticas fundamentadas que pululam por todas as partes e que ganham mais destaque atualmente com o advento da internet. Essa é, aliás, a grande diferença dos nossos dias.
Só para iniciarmos a argumentação, é importante lembrar a sintomática declaração da ex-presidente da Associação Nacional dos Jornais (ANJ), Maria Judith Brito, que atribuiu às empresas jornalísticas o papel de oposição política, já que – na visão dela – não há nenhum partido com força para fazer este papel no momento. Aqui já há um erro grotesco sobre o papel do jornalismo. É certo que a imprensa deve fiscalizar o poder, mas para isso não há necessidade de que ela se torne partidária. Há uma profunda diferença de conceitos aqui.
Sabemos que a missão do jornalismo honesto é noticiar o que é de interesse público, sem privilegiar lados. Também é dever do jornalismo não se apoiar em denuncismos, ou seja, notícias sem fundamentos. Foi marcante e vergonhoso, por exemplo, o silêncio que a grande imprensa fez sobre o livro Privataria Tucana, de autoria do jornalista Amaury Ribeiro Jr., que traz uma vasta documentação que aponta a promiscuidade das privatizações feitas no governo FHC, envolvendo lavagem de dinheiro, favorecimentos, paraísos fiscais e uso da máquina pública em favor de poucos.
Por que será que tal assunto não rendeu capa em diversas grandes revistas semanais ou o devido destaque nos chamados jornalões? A resposta é simples: partidarismo. Qualquer nota ou comentário que tenha aparecido nesses veículos, exceto na TV Record, foi apenas para criticar, sem nem mesmo ouvir o autor da obra, classificado como petista ou simplesmente esquerdista. De lá pra cá, o tom das críticas em relação à grande imprensa tem aumentado, e muito, não sem razão. No início de 2013, e no decorrer de todo o ano que passou, a grande imprensa fez diversos prognósticos pessimistas sobre o Brasil, que simplesmente não se concretizaram. E isso se deu porque não tinham fundamentos concretos.
Falhas de caráter
Criadora de pânico?
Vimos a imprensa dizer, no início do ano, que estávamos à beira de um apagão elétrico. Posteriormente, vimos uma enorme “gritaria” sobre a inflação, que estaria fora de controle. Também foi bradado, com toda força, que o superávit primário não seria atingido. Também não podemos esquecer que durante todo o ano foi dito que a inadimplência do consumidor crescia assustadoramente. Previu-se até que os estádios não estariam prontos para a Copa das Confederações. Enfim, o que se confirmou? Nada.
O Brasil não está nem perto de viver uma crise energética; a inflação ficou bem abaixo do teto da meta para 2013; o superávit primário foi alcançado com êxito; a inadimplência caiu 2%, algo inédito, desde que a pesquisa do Serasa começou a ser feita e a Copa das Confederações foi um sucesso! Mas criou-se um clima de incertezas. Esse pessimismo todo da grande imprensa não é gratuito, isso se chama partidarismo. Podemos ou não criticar?
O jornalista Eugênio Bucci, em artigo publicado no Estado de S.Paulo (“Dos que tanto amam odiar a imprensa“), em 26 de dezembro de 2013, criticou aqueles que criticam a imprensa, mas reconhece que os grandes veículos do jornalismo brasileiro são “preponderantemente de direita e, muitas vezes, apresentam falhas de caráter, alguns inomináveis”. Como rebateu Celso Augusto Schröder, presidente da Fenaj, em artigo publicado no próprio site da instituição (e reproduzido no site Análises e Estudos do Jornalismo), esses fatos já não são suficientes para se fazerem críticas?
Caso antigo
Falhas de “caráter inomináveis” devem ser denunciadas e criticadas sempre, principalmente se os grandes veículos se posicionam “preponderantemente” de um lado. Não importa se for direita ou esquerda. No artigo “Em busca de um jornalismo mais honesto“, falo sobre a importância de se adotar no Brasil a mesma postura dos grandes veículos jornalísticos dos EUA, que declaram abertamente qual candidato ou partido apoiam, deixando seus leitores cientes da posição política do informativo. É bem mais honesto do que posar de imparcial e esconder fatos de interesse público ou construir reportagens que se dizem isentas, mas que, claramente, possuem objetivos partidaristas.
Como escrevi no artigo citado, não há nada demais em um veículo de jornalismo declarar que defende princípios de direita ou de esquerda, pois isso não significa que sua honestidade será atingida. O que não pode haver são omissões vergonhosas, que escondem grandes esquemas de corrupção ou fazer reportagens que colocam, sumariamente, pessoas acusadas como culpadas.
Não se trata, portanto, de fazer parte “dos que tanto amam odiar a imprensa”, pelo contrário, por amar o papel histórico mundial da Imprensa é que se a critica tanto para que esta seja plural, equilibrada e não monopolizada. Este é o cerne da questão. As críticas são sempre bem-vindas e democráticas.
Historicamente, este é um problema crônico em nosso país. A história brasileira é rica em demonstrar as relações de favoritismos e disputas pelo poder, envolvendo empresários, multinacionais, partidos e a grande imprensa com coberturas partidárias. Exemplos não faltam. Ocorreram na Era Vargas; no governo JK; no golpe de 1964; na eleição de Leonel Brizola para governador do Rio de Janeiro, na década de 1980; na edição do debate entre Lula e Collor na TV Globo e muitos outros.
Em breve publicaremos um estudo sobre o partidarismo da imprensa brasileira ao longo do século 20. Veremos a presença de interesses de grupos internacionalistas, multinacionais, potências econômicas e outros influenciando a produção jornalística do nosso país, ajudando a construir uma realidade falsa, pra derrubar presidentes e fazer valer seus interesses econômicos.
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Bruno Barros Barreira é jornalista e professor de História.